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21 de outubro de 2010

Cultura, não subestime essa pedra

Vou lhes apresentar uma personagem famosa, mas provavelmente vocês já a conhecem ou ouviram falar dela, tenho certeza. É a pedra de crack. Temendo os muito desinformados, vou fazer uma breve apresentação dessa não-amiga mas colega de convívio social. Ela é pequena feita da pasta da cocaína e bicarbonato de sódio, é fumada em cachimbos muitas vezes improvisados com latinhas de cerveja ou qualquer coisa que permita inalar enquanto é queimada. Os usuários mais “prevenidos” usam cachimbos de verdade. Essa bomba chega no sistema nervoso central em dez segundos no máximo, gera uma euforia que dura entre 5 e 10 minutos e causa dependência quase que instantânea. Lembraram dela? Pois bem, esta inimiga pública está bagunçando com a vida das famílias de todos os cantos do Brasil.

Nós da Central Única das Favelas (CUFA) vínhamos acompanhando e estudando o triste avanço desta droga desde 1998 quando iniciamos a produção do documentário Falcão - Meninos do Tráfico e nossas estimativas à época apontavam para uma epidemia do crack em 2013 e da merla em 2017. Infelizmente parece que erramos, mas apenas na data, pois esta epidemia parece ter chegado bem antes, tragicamente. E em nosso Estado não foi diferente, pois o consumo de crack por aqui cresceu vertiginosamente, chegando a romper com o pudor tradicional do povo goiano e de nos fazer conviver com usuários de crack à luz do dia em ruas e praças da cidade, “deprimindo a paisagem”, como se esse fosse o maior dos problemas.

Daí eu pergunto aos mais regionalistas, que se orgulham da polícia goiana, da qualidade de vida da Capital, de não termos favelas, da nossa suposta tranqüilidade: Goiás é tão pacífico assim? Hoje vemos com grande frequência nos noticiários mães desesperadas acorrentando os filhos viciados para não os perderem para um traficante vingativo que cobram dívidas. Vemos traficantes de 10 anos chefiando bocas de fumo, e eu não estou falando de 10 anos de profissão, estou falando de crianças de 10 anos de idade! Caramba no meu tempo eu me achava avançadinho por ter uma namoradinha com essa idade, mas hoje os moleques de 10 anos são "patrões" do empreendimento mais ágil do planeta, o tráfico. Mas o curioso é que o crack vem destruindo não só a vida das famílias pobres como sempre acontece, mas começou a estragar demais a vida das famílias de classe média e média alta, que descobriram que o crack é resistente à clinicas de recuperação para dependentes químicos, pois estima-se que 80% dos usuários não consegue reabilitação do vício.

Prova disto, essa semana quando um jovem de classe média viciado em crack roubou um ônibus e saiu pela cidade em disparada causando pânico e provocando um tiroteio por parte da polícia que tentou pará-lo, e parou, pois o jovem foi neutralizado fatalmente, tudo em plena luz do dia. Talvez agora a sociedade se mova, pois o problema está chegando onde o calo é mais sensível, os não-Favelados.

Vi campanhas na TV do Governo contra o crack em parceria com o Ministério Público e o Tribunal de Justiça, com artistas conhecidos fazendo alertas, mas tudo isto parece ter ficado apenas na esfera do aviso, sem combate direto, e não estou falando de polícia, estou falando de prevenção, que é e sempre será mais barata e eficiente do que a repressão e que de tão óbvia fica esquecida. ATENÇÃO SOCIEDADE! É muito arriscado deixar o crack vivo e transformá-lo em eterno fazedor de votos em campanhas eleitorais, pois até lá metade dos eleitores pode ter sido dizimada.

Portanto candidatos, não insiram apenas o combate pós-vício em suas campanhas, mas sim apresentem projetos de prevenção ao Crack e outras drogas. Não vejam a cultura e o esporte apenas como entretenimento e lazer, mas como instrumentos de socialização e conscientização, que salvam da tragédia muitas vidas e famílias. Não vejo propostas apresentadas em seus programas eleitorais na TV com esta perspectiva, apresentadas de forma real e objetiva. E lá vai mais uma dica: cuidem disso, pois o eleitor costuma esquecer de quem os esquece e a cultura e o esporte em Goiás podem ser uma pedra pequena, que ou vocês decidem carregar no sapato por 4 anos, investindo pesado juntamente com saúde, segurança pública e educação, ou vão tropeçar nela e cair e só tentar eleição de novo daqui há uma Copa do Mundo. Assim, à exemplo do Crack, sobre a cultura, não substime essa pedra.

Dyskreto é rapper, ativista cultural e coordenador da Central Única das Favelas de Goiás (www.twitter.com/Dyskreto)

*Artigo publicado no DM Revista do jornal Diário da Manhã, edição de quinta-feira, 21 de outubro de 2010.

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